Não me interpretem mal, eu sempre fui menina de praia. Adoro a costa e a sensação da pele salgada, o cheiro a maresia faz-me sorrir e lembro-me de fugir para o areal da linha de Cascais a cada dia de férias, independentemente do tempo que fizesse. Era quase o meu quintal até acabar a faculdade.
Nos últimos anos tenho colmatado a falha enorme que era não conhecer melhor o nosso interior. Os meus avós cresceram em Lisboa e os meus pais já nasceram por cá. O mais longe que ia quando ia com eles “para a terra” era para Santa Cruz onde tinham casa de fim de semana. Nunca tive essa relação afectiva com os meses de férias estivais nas origens familiares interiores, que conheço a muita gente. Mas tenho vindo a construir memórias adultas de norte a sul a pé, de bicicleta ou em quatro rodas.

Quando me juntei à iniciativa #euficoemportugal da Associação de Bloggers de Viagem Portugueses, à qual me associei recentemente, quis o acaso feliz que “sobrasse” para mim a região de Foz Côa, para redescobrir e promover. Tenho já uma relação afectiva e de grande admiração para com a Reserva da Faia Brava que queria revisitar e mostrar e atravessei esta zona o ano passado de bicicleta tendo ficado com muita vontade de vir com mais calma. Foi ouro sobre azul.

Noutra daquelas estocadas mestras do destino, o meu amigo Diogo Tavares estava a organizar um trekking no Gerês na semana anterior à que tinha programada para a visita a Foz Côa.

Com o apoio da Portugal By Van, juntei tudo em duas semanas de contorno a meio Portugal, alternando a “casa às costas” em quatro rodas, com a “casa às costas” na mochila e duas estadias em lugares muito especiais.

A auto-caravana deu-me a autonomia de escolher a rota mais cénica, dormindo onde apetecia e dava jeito. Foi transporte e casa umas vezes e foi só transporte outras. Deu-nos dias movidos a liberdade, por montes e vales normalmente ignorados por este tipo de veículos.

Esta apologia do interior surge também como um convite aos caravanistas a sair dos aglomerados da Costa Vicentina e da Ericeira e vir percorrer estradas menos ocupadas.

Há territórios carregados de história e património, rios e vales esculpidos pela força da natureza e pela persistência do trabalho do homem há milénios e gente que recebe como se fôssemos sempre convidados de honra.

Há uma gastronomia que preenche muito para além do estômago e conforta os sentidos todos num abraço de avó, como quem diz “Cabe sempre mais um bocadinho”. E há o vinho, omnipresente na história e nas histórias e na paisagem de vinhas de cores cambiantes consoante a estação do ano.

Venho de coração cheio e com muitos contos que contar. É só tempo de deixar as ideias assentar. Entretanto, deixo-vos com palavras do José Luís Peixoto, que vêm no album lindíssimo do Homem em Catarse “Viagem Interior”
“E se o interior do país e a ruralidade contiverem não apenas passado, mas também futuro?
Em todos os instantes construímos o que virá. Estamos aqui, existimos, ainda estamos a tempo.”
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